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sábado, 5 de junho de 2010

da memória olfativa



 Uma carta:

 Oi. 
Como estão as coisas por aí? Aqui não muda muito. Um pouco de trabalho, um pouco de diversão, música sempre que possível. 
Tô escrevendo, porque queria muito que você soubesse de uma coisa.
Hoje eu estava sentado perto de uma mulher qualquer, num lugar qualquer - sequer me lembro que cara tinha, apesar de ela ser um ponto crucial na minha história.
Eu lia. Não saberia dizer agora o que era, mas eu lia algo pra matar o tempo. Talvez fossem notícias, talvez o fim daquele livro que anda na minha mochila há meses. O fato é que eu lia.
Num minuto em que abaixei a cabeça, provavelmente por cansaço, nesse instante meio bobo, inspirei um cheiro que vinha claramente dessa mulher - que, agora me recordo, usava uma camisa branca. Acho que era camisa, não sei. Tinha mangas. O perfume que senti me levou por 37 segundos à uma praça que por muito tempo eu evitei: foi o palco do início e, ironicamente, do fim também.
O que eu queria dizer na verdade é que quando senti esse cheiro, enxerguei você usando aquela blusa preta que eu amava e odiava ao mesmo tempo, por ser colada e meio curta demais; uma saia jeans toda cheia de pontas e um all star de cano, preto também, se não me engano. Você sempre ficou bem com esse tipo de roupa. E estávamos sentados, um de frente pro outro, ali perto das escadarias e conversávamos como se não houvesse mais nada no mundo. Senti saudade, sabe?
Você era tão novinha e agia de uma forma tão adulta. Hoje acho que entendo, mas na época, além de me encantar, me assustava um pouco. E você nem mudou tanto. Só ficou um pouco mais dura, eu acho. Mas, olha, meu bem, não endureça mais não, viu? A doçura que eu via naquela época, tanto tempo atrás, não devia ficar escondida assim.
Bom, não vou encher sua cabeça com essas nostalgias meio bestas, mas você sabe que sou péssimo com finais de cartas, de textos, de tudo. Só queria te contar que aqui do outro lado do oceano seu cheiro ainda me persegue. Precisa nem responder, se não quiser. 
Fica bem , tá?

Um beijo, 
A.

7 comentários:

Tati disse...

Ai, dels. Que lindo. *___*

Cachorro de 3 pernas disse...

é de verdade? Mó massa essas cartas assim... despretensiosas eheheh

Deise Duarte disse...

Sem final. Porque nunca se sabem escrever finais. Nas histórias, nas fábulas, na vida... Bom seria se sempre coubesse: Felizes para sempre.

Juliana Dacoregio disse...

Lindo! :)

Cris disse...

Nossa, muito inspirada! Tá de parabéns!

Joyce Pfrimer disse...

"senti saudade sabe?"

=)

Anônimo disse...

Nossa! linda esta carta..